Vamos ver, neste artigo, que o sal não é todo igual, e é importante ingerir algum sal para que o corpo desempenhe funções vitais.
Do ponto de vista da macrobiótica, o sal é um alimento extremo (yang), mas ingerido de forma moderada tem a capacidade de nos focar, isto é, acaba por nos trazer equilíbrio e trazer “para o centro“. Ingerido em exagero pode levar-nos para o extremo de contração e inflexibilidade.
Vou falar aqui do conhecido “sal de cozinha”, que é o único que tratamos apenas por “sal”, e que é constituído quase na totalidade por cloreto de sódio (NaCl).
No entanto, há muitos tipos de sais, mas quando nos referimos a eles damos-lhe o nome que tem a ver com os elementos químicos que os constituem. Exemplos conhecidos e utilizados de forma comum são: o cloreto de magnésio (MgCl2) com que se faz o tofu; o sulfato de magnésio (MgSO4 ) conhecido como sal de Epson; o cloreto de potássio (KCl) muito usado na agricultura como fertilizante.
História do sal
No antigo Império Romano o sal valia tanto como o ouro. Para pagarem os seus legionários os imperadores usavam o sal. Repare na origem das palavras:
- salário ou soldo vem do latim salarium que significa “pagamento em sal“.
- soldado significa “aquele que recebe o pagamento em sal”.
O sal foi utilizado por muitas culturas como moeda de troca. Era difícil obtê-lo no interior dos continentes e a sua importância devia-se sobretudo à sua capacidade de conservar os alimentos. Por esse motivo o sal já foi um alimento precioso e estimulou as trocas comerciais entre os povos. Na Idade Média um homem rico demonstrava a sua riqueza, colocando grande quantidade de sal sobre a mesa quando recebia convidados para comer na sua casa.
Se quiserem saber mais sobre a cultura e história do sal recomendo o livro do jornalista Mark Kurlansky, Salt: A World History.
Neste livro descreve-se a importância do sal em todas as culturas e em todos os continentes e como o sal esteve presente em muitos momentos históricos da humanidade desde a pré-história até à revolução industrial.
Qual o sal que devemos consumir?
Há uma diferença enorme entre o sal refinado e o sal marinho integral tradicional (1) em termos de composição e consequentemente no efeito que tem no nosso corpo.
Sal marinho integral tradicional
Como devem imaginar, quando estava a preparar este artigo fui ver a composição média do sal marinho integral tradicional, pois este não contém apenas cloreto de sódio. O sal marinho integral tradicional contém cerca de 36 minerais e oligoelementos (alguns essenciais) presentes nas proporções naturais da água do mar. Entre eles destaco: magnésio, cálcio, potássio, ferro, zinco, manganésio, iodo e o flúor.
O Sal Marinho Tradicional, é produzido em pequenas salinas centenárias, utilizando métodos ancestrais . É um processo 100% natural, sem qualquer processamento, ou uso de aditivos químicos, utilizando somente a água do mar, energia solar e o trabalho do Homem. (1) Este processo permite que sejam mantidos todos os minerais presentes na água do mar.
Quando consumimos sal marinho tradicional, estamos a consumir um alimento naturalmente enriquecido pela natureza. É este o sal que devemos usar na cozinha.
Em Portugal temos muitas salinas ativas. Eu já comprei sal desde Aveiro até ao Algarve, e como vivo em Setúbal, com facilidade compro aqui nas salinas do Sado. Deixo informação sobre onde poderá comprar sal marinho integral tradicional diretamente numa salina (2).
Sal refinado
O sal refinado entrou na nossa alimentação e passou a consumir-se por uma questão prática de armazenamento (já explico porquê). Na sua produção é submetido a processos térmicos de refinação e de branqueamento. O que resta no final destes processos é apenas o Cloreto de Sódio perdendo toda a sua riqueza em outros minerais.
Para além disso o sal refinado é aditivado com antiaglomerantes para que possa ser armazenado seco. Esta é a questão fulcral: quem já comprou sal em salinas tradicionais, sabe que ele é húmido e absorve a água presente no ar, sendo difícil de conservar. Para ser armazenado e vendido “seco” o sal tem mesmo de passar por processos industriais.
Não é recomendável usar sal refinado e este não deve ser usado sequer para temperar uma salada. Para temperar salada recomendo flor de sal. Mais uma vez digo: devemos consumir os alimentos no seu “pacote natural” tal como a natureza o proporciona.
Flor de sal
Acabei de dizer que para adicionar em cru numa salada ou retificar o sabor de um prato no final, recomendo a flor de sal. Achei esta descrição deliciosa:
A Flor de Sal foi desde sempre consumida em Portugal pelos Marnotos (trabalhadores da salina) em sua casa. Davam-lhe o nome de “coalho” por flutuar à superfície da água tal como a nata no leite.
A Flor de Sal é composta por cristais leves, em forma de palheta, de uma brancura extrema, que se formam na superfície das pequenas peças da salina, formando uma fina película de sal que as cobre. Essa “película” é colhida diariamente, com um rodo (instrumento manual de recolha), necessitando para o efeito de perfeitas condições climatéricas.
A grande vantagem da Flor de Sal é o seu sabor, ou melhor, os sabores que esta desperta nos alimentos. (1)
Sal dos Himalaias
Falo aqui do sal do sal dos Himalaias ou sal rosa, porque tenho quase a certeza de que têm esta questão. Fala-se tanto deste sal, afinal ele é recomendável?
O sal rosa ou sal dos Himalaias é retirado de depósitos milenares de sal, nas cadeias montanhosas dos Himalaias ( e noutras regiões apesar de no rótulo continuar a dizer “Himalaias”). Estes locais locais, onde agora existem estas minas de sal rosa, estavam cobertos de água há milhares de anos. É um “sal marinho” que deixou de estar em contacto com a a água há muito, muito tempo.
Faz sentido consumir este sal, seco há tanto tempo, mesmo que tenha os mesmos nutrientes de um sal marinho integral? Sobre isto gostava de dizer o seguinte:
- não é um produto local;
- a sua extração tem custos ecológicos brutais;
- a sua extração está associada a exploração humana (em condições não humanas);
- é um recurso finito;
- do ponto de vista energético é um sal que não está em contacto com água há muito tempo, e a sua natureza será ainda mais yang e contrativa.
Faça uma pequena reflexão e depois decida se, para si, ainda vale a pena comprar sal rosa (eu sei que a cor é muito atrativa).
O sal na Macrobiótica
Irei falar mais à frente das necessidades de sal no corpo humano para desempenhar funções essenciais, no entanto, quero primeiro falar do sal e do sabor salgado do ponto de vista da macrobiótica.
O sabor salgado está associado, desde a perspetiva oriental, à Transformação Água. Dentro desta transformação, considera-se que os rins são nutridos por este sabor, mas em excesso o sal tem um efeito nefasto neste mesmo órgão, os rins, principalmente se for sal de má qualidade associado a alimentos de origem animal.
No Instituto Macrobiótico de Portugal – IMP (3) aprendi que sal marinho integral é essencial para a criação de um bom sangue, linfa e fluidos corporais assim como para os sistemas digestivo e nervoso. O sal beneficia para além dos rins, a bexiga, o coração e o intestino delgado e deve ser consumido com moderação.
O sal é o extremo yang quando observamos a tabela de alimentos considerada na macrobiótica.
Por isso é necessário refletir: se queremos os benefícios do sal que é o de nos ajudar a focar e manter centrados, ele deve ser consumido com moderação. Caso contrário terá efeitos contrativos e pode conduzir-nos para estados de doença.
Com muita facilidade na macrobiótica se consome muito sal. Isto porque se usam muitos condimentos salgados: miso, pickles de vegetais salgados, shoyu, tamari, gomásio (ou gersal), entre outros. Por isso devemos ter cuidado com a adição de sal se estivermos a temperar ou a utilizar alguns dos alimentos que referi.
Também aprendi no IMP, e faz todo o sentido, que o grande problema do sal está na sua associação com alimentos de origem animal, principalmente os enchidos, o queijo curado, as carnes e peixes grelhados, o bacalhau muito salgado. Portugal é um país que usa imenso os alimentos que referi e a hipertensão é uma doença com índices elevados entre nós.
Uma nota final: o sal não deve servir para temperar à mesa (em cru), ele deve ser utilizado na confeção da comida e o hábito de ter um saleiro à mesa deve ser eliminado.
Video-receita de Gomásio e de Goma Wakamé
Tenho uma receita no canal de YouTube, onde ensino a fazer um Gomásio com muito menos sal do que o tradicional (e que fica mesmo assim bastante salgado) e um “substituto” Gomásio, que se chama Goma Wakamé, que nem sequer leva sal. Deixo aqui a ligação:
Quer o Gomásio quer a Goma Wakamé, são extremamente ricos em minerais, principalmente cálcio, devido às sementes de sésamo (gerlelim).
Benefícios do sal
Existem benefícios no consumo de sal com moderação. Sem sal os nutrientes presentes no sal, muitas das funções do corpo humano não se poderiam realizar.
Porque é que necessitamos de sal?
O sal desempenha um papel fundamental no corpo humano. Quando não nos alimentamos, em situações extremas, podemos passar vários dias a receber uma solução salgada por via intravenosa, chamada de Soro Fisiológico, que é uma solução que, para além de poder conter outras coisas, tem cloreto de sódio. Podemos por aqui perceber que uma das preocupações médicas é a de manter os níveis de cloreto de sódio (sal) em circulação no corpo.
Em termos de funções no corpo humano, quando consumido com moderação o sal desempenha funções importantes, das quais refiro algumas:
- É o sódio que permite a condução de impulsos nervosos (que não são mais do que impulsos elétricos e que por isso necessitam de um meio condutor);
- O sódio contribuí para o funcionamento muscular (contração dos músculos);
- Desempenha um papel fundamental na produção de bílis;
- A bílis contribui para a existência de movimentos peristálticos do intestino, pelo que também aqui é necessário;
- Tem um papel fundamental no transporte de nutrientes para dentro das células.
- Alcaliniza o corpo.
- Ajuda na manutenção da pressão arterial.
Malefícios do sal
O consumo exagerado de sal, principalmente quando utilizado junto com alimentos de origem animal, traz grandes malefícios. Nomeadamente tem influência no aumento da pressão arterial conduzindo à Hipertensão Arterial (HA)
Segundo a Organização Mundial da Saúde, a HA é o principal fator de risco para as doenças crônicas não transmissíveis. Evidências científicas mostram que pequenas reduções na pressão arterial (PA) têm
grande impacto na redução da morbidade e da mortalidade cardiovascular.
A HA tem efeitos adversos sobre órgãos vitais, como coração e rins.
O problema nas sociedades modernas é que se utiliza uma grande quantidade de sal para dar sabor aos alimentos processados industrialmente. Estes alimentos são confecionados com sal refinado que, como falei acima, não traz benefício nenhum. Com muita facilidade, ao consumirmos alimentos industrializados, numa única refeição podemos ultrapassar o limite de sal que devemos consumir diariamente.
Alguns conselhos finais
Depois do que apresentei, gostava de deixar alguns conselhos:
- Utilize apenas sal marinho integral tradicional. compre sal diretamente numa Salina, vai adorar o passeio e vai trazer saúde para casa.
- Habitue o seu paladar a alimentos menos salgados. Garanto que o paladar é muito versátil, e que se utilizar sal na quantidade certa, vai perceber que o sal serve apenas para realçar o sabor dos alimentos, nunca para os salgar.
- Transforme o seu saleiro de mesa num dispensador de canela:) Digo isto porque me custa dizer-lhe para eliminar o saleiro de mesa, mas é mesmo isso, elimine-o de sua casa.
- Use ervas aromáticas para dar sabor aos alimentos e reduza para metade a quantidade de sal adicionada.
- Quando usar condimentos salgados (shoyu, vinagre de umeboshi, miso, tamari, tekka, …) ou pickles salgados, não adicione sal.
- Use condimentos como o Gomásio (feito com uma proporção de sal baixa) ou a Goma Wakamé. Tenha um frasco com eles (podem muito bem substituir o saleiro de mesa).
- Tempere a sua salada com uns pingos de vinagre de ameixa umeboshi (é um fermentado salgado e deve ser usado com moderação) e evite o sal cru.
Use o sal com moderação. Em pouca quantidade dá sabor a tudo. Em muita quantidade, contrai, trona-nos rígidos e pode provocar doença.
Em Portugal, quando queremos dizer que alguma coisa não sabe a nada, até dizemos que “não tem sal”, ou quando nos referimos a uma pessoa desinteressante (no nosso ponto de vista) dizemos “é um pãozinho sem sal”. Acima de tudo que a sua vida tenha sal e sabor.
Com Amor,
Dulce da Mil Grãos
Referências
(1) Informação sobre os vários tipos de sal http://www.necton.pt/index.asp
(2) Onde pode encontrar salinas e adquirir sal: https://www.e-konomista.pt/salinas-portuguesas/
2 Responses
Olá viva! Adoro o seu trabalho, e só agora percebi que tem este blog.
Deixo-lhe uma dica sobre onde encontrar sal gema, nas Salinas em Rio Maior também há muito sal e produzido e apanhado manualmente.
Grande beijinho e boa continuação!
Olá Joana:)
Obrigada por acrescentares esta informação. As Salinas de Rio Maior são lindas e têm um ótimo sal.
Um beijinho
Dulce