Mindfulness: atenção plena. Como é que o mindfulness entrou na minha vida

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O nome mindfulness entrou na minha vida pela mão de um monge budista vietnamita chamado Thich Nhat Hanh1The Miracle of Mindfulness, Thich Nhat Hanh.

Isto é o que nos torna humanos, o que nos distingue dos outros animais. Podermos estar conscientes de estar conscientes.

Jon Kabat-Zinn

Em criança para mim era muito fácil estar perfeitamente focada no que estava a fazer, uma coisa que até irritava os meus irmãos que tinham dificuldade em distrair-me com conversas e brincadeiras se eu estivesse a desenvolver alguma atividade que me exigisse concentração. Lembro-me de ter prazer genuíno em tudo o que fazia.

Em jovem, entre os meus 18 e 23 anos, a prática formal e informal de mindfulness foi uma constante. Não havia um dia em que não praticasse, mas não sabia que aquilo que fazia tinha esse nome.

Sabia sim que permanecia ligada no presente com muita facilidade, que era muito mais focada e obtinha melhores resultados nos estudos do que a maioria dos meus colegas, que percebia com antecedência os sinais do meu corpo e sabia lê-los de forma a poder adequar a minha resposta aos estímulos externos e internos.

Tinha uma “visão externa” de mim, uma consciência interna e uma perspectiva da totalidade do que me envolvia.

Relembro essa fase da minha vida com muito agrado, era muito feliz, e durante muito tempo quis voltar a esse “estado”, porque fui perdendo a minha identidade quando deixei a prática formal.

Esse período, em que deixei a meditação, coincidiu com o arranjar trabalho, casar e ter 3 filhos. Procurava oportunidades para parar e meditar, mas não o conseguia fazer de forma regular, mais por falta de compromisso do que de tempo.

Quando deixei a prática de meditação mindfulness muitas vezes sentia que “eu não era eu”.  Mas sempre soube qual era o caminho para “casa” e nesses anos que mediaram os 25 e aos 40 anos,  li muito sobre meditação, sobre mindfulness e comecei a ler e a ouvir dharma talks do Monge Budista Thich Nhat Hanh.

Há cerca de 6 anos decidi assumir um compromisso para comigo, e voltei à prática regular. O que é que mudou para que eu tivesse tempo? Nada. Tenho trabalho (muito), família, os três filhos,…

A diferença na minha vida, desde que retomei a meditação, começou a fazer-se sentir. Foi como um regressar a casa, à minha pele, à apreciação genuína pela vida que se revela a cada instante, às possibilidades infinitas que estão nas escolhas momento a momento, ao olhar que vê mas não julgaà inteligência do corpo que comunica as suas necessidades atempadamente, à visão externa de mim e do todo,…

Comecei depois a ler o trabalho desenvolvido pelo Professor Jon Kabat-Zinn2Full Catastrophe Living: How to cope with stress pain and illness using mindfulness meditation, Jon Kabat-Zinn e decidi fazerCurso de Redução de Stress Baseado em Mindfulness3MBSR – Mindful Based Stress Reduction seguido do Treino Intensivo para Professores4MBSR TTI: Mindfulness-Based Stress Reduction Teacher Training Intensive.

Porquê? Porque mindfulness é uma das ferramentas mais poderosas para viver de forma plena que conheço, um autêntico milagre, como lhe chama Thich Nhat Hanh. Talvez seja a única forma de estar verdadeiramente vivoprestando atenção deliberadamente ao momento presente, completamente conscientes do que se passa dentro de nós (corpo, coração e mente) e do que se passa à nossa volta, sendo esta observação sem julgamento ou crítica.

Mindfulness e meditação

Mindfulness e Meditação - Mil Grãos

“Com o mindfulness, não ficamos apenas tranquilos e felizes, mas alerta e despertos. A meditação não é evasão; é um encontro sereno com a realidade.”

Thich Nhat Hanh

Falei sobre meditação. Então mas mindfulness é meditaçãoSim e não.

Sim, porque é necessário ter uma prática/treino que só se adquire numa prática formal, regular, sentada, de meditação mindfulness.

Não, porque mindfulness é esta capacidade de estar no “Aqui e Agora” em todos os momentos (e não só na prática formal), tendo consciência das distracções e retornando ao momento presente as vezes que forem necessárias, e isso manifesta-se em todos os momentos do dia.

Vou dar um exemplo. Imaginem que tenho um alguidar de meias para dobrar.

Há várias formas de dobrar as meias. Ou com aborrecimento e zanga, a pensar naquilo que tive que interromper para poder dobrar as meias. Ou à pressa, a pensar que quanto mais depressa despachar aquilo, mais depressa posso ir “viver a minha vida” (como se dobrar as meias não fizesse parte do milagre de estar vivo). Ou com consciência total do que estou a fazer; presente e consciente das sensações no corpo e das distracções que surgem enquanto dobro as meias, com o foco no momento presente e não naquilo que fiz antes ou vou fazer a seguir. Nesta última opção dobro as meias e vivo aquele momento como se realmente valesse a pena estar vivo.

Enquanto escrevia isto, uma das minhas gatas, a Miu, veio para o meu colo e tive que parar de escrever. Esta gata, em particular, é uma excelente instrutora de mindfulness. Enquanto está ao meu colo não me deixa fazer mais nada senão dar-lhe colo e fazer-lhe festas. Faz-se presente de uma forma tão inquestionável que, por alguns minutos, só existo eu e ela.

Todos nós já tivemos momentos de estar completamente ausentes da nossa vida, em “piloto automático”. Quantas vezes já chegaram ao trabalho, estacionaram e não se lembram de grande parte do caminho que fizeram até ali? Ou quantas vezes têm que voltar atrás para verificar que fecharam o carro? E enquanto tomam banho, quantas pessoas estão convosco no duche (em pensamento), e terminam o banho sem terem sentido a água a correr, o cheiro do shampoo ou a cremosidade da espuma?

Todos nós também já tivemos momentos em que estivemos absolutamente vivos e conscientes (em Atenção Plena). Quando abraçaram alguém e tiveram plena consciência daquele momento e das sensações no vosso corpo? Ou no momento em que colocam uma garfada da vossa comida preferida na boca e tiveram a sensação de que estão plenamente vivos tal a intensidade de sensações que vos prende àquele momento? Ou quando ficaram a ver um pôr-do-sol, totalmente embrenhados na experiência como se só existisse aquele instante?

Benefícios

Mindfulness nas crianças - Mil Grãos

“Não podemos parar as ondas, mas podemos aprender a surfar”

Jon Kabat-Zinn

mindfulness é uma prática milenar e está no coração do Budismo. No entanto, Jon Kabat-Zinn, Professor Emérito da Faculdade de Medicina de Massachusetts e Director do Centro de Redução de Stress dessa Faculdade, trouxe-o para o mundo ocidental. Não é correto dizer que secularizou esta prática, mas apenas que tornou possível que esta fosse acessível a todos, independentemente da religião (ou ausência de uma prática religiosa).

Durante a meditação mindfulness formal, a prática será sempre dirigida de forma a manter a nossa atenção focada no momento presente. Recorrendo à respiração (já deste conta que está a respirar?), às sensações corporais ou a outro foco que nos ajude a estar no “Aqui e Agora”. Quando damos conta que nos distraímos com pensamentos ou algum estímulo externo, voltamos outra vez a atenção ao momento presente, sem recriminação ou frustração por nos termos distraídos. Isto é feito repetidamente, porque como devem imaginar, não é fácil, de um momento para o outro, parar a torrente de pensamentos que nos assaltam constatemente. É claramente um treino.

Aquilo que fazemos repetidamente torna-se mais forte. Por isso, o que estamos a fazer numa prática de meditação mindfulness é a aumentar e reforçar este estado de consciência e presença. A neuroplasticidade cerebral permite criar novas ligações e reforçar as existentes quando realizamos a mesma atividade com regularidade.

Os benefícios do mindfulness estão cientificamente estudados e comprovados, sendo reconhecidos a nível mundial por várias entidades de referência na área da medicina e psicologia. Os primeiros estudos publicados sobre este assunto, em meados dos anos 80, demonstraram as vantagens do mindfulness quando praticado por pessoas portadoras de dor crónica. Desde essa altura, milhares de estudos científicos foram feitos e os resultados publicados.

As evidências científicas sobre o mindfulness (prática formal) indicam que há benefícios sobre várias regiões do cérebro (por aumento da espessura cortical em zonas relacionadas com a atenção): melhora a capacidade de concentração, a memória, a orientação espacial, a capacidade de decidir de forma mais adequada, melhorando também a capacidade de lidar com situações stressantes e de regular as emoções. Outros benefícios relatados indicam também maior capacidade de tolerar dor, de viver com doença crónica, a percepção corporal e até melhora a imunidade. Os benefícios são imensos e cada vez há mais estudos surpreendentes a comprová-lo.

O mindfulness não faz só bem à mente, faz bem ao coração e ao corpo como um todo.

Com o mindfulness a nossa vida (trabalho, família, problemas, dor…) não muda. Muda é a nossa forma de nos relacionarmos connosco e com a vida como ela surge. Tal como diz o Professor Jon Kabat-Zinn: não podemos parar as ondas, mas podemos aprender a surfar.

Comentários

3 Responses

  1. Que lindo isso, Dulce <3
    A viagem ao interior do nosso ser, é a mais linda e gratificante das nossas vidas. Obrigada pelo testemunho, dedicação e Luz que nos presenteia no seu depoimento.

    Bem-haja,
    Raquel

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Dulce

Com formações e experiência nas áreas da Macrobiótica e no Mindfulness, desenvolvi o projeto Mil Grãos, onde o foco é oferecer-lhe informações, conhecimento, prática e experiências para uma vida mais Humana, Ecológica e Espiritual.

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